A justiça gratuita será concedida aos que não tenham condições de arcar com as custas do processo. Tal isenção está prevista na lei nº. 1.060/1950 assim como no novo Código de Processo Civil.

Vejamos o que diz o novo CPC:

Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei. 

Conforme o § 1º di citado artigo, gratuidade da justiça compreende:

I – as taxas ou as custas judiciais;

II – os selos postais;

III – as despesas com publicação na imprensa oficial, dispensando-se a publicação em outros meios;

IV – a indenização devida à testemunha que, quando empregada, receberá do empregador salário integral, como se em serviço estivesse;

V – as despesas com a realização de exame de código genético – DNA e de outros exames considerados essenciais;

VI – os honorários do advogado e do perito e a remuneração do intérprete ou do tradutor nomeado para apresentação de versão em português de documento redigido em língua estrangeira;

VII – o custo com a elaboração de memória de cálculo, quando exigida para instauração da execução;

VIII – os depósitos previstos em lei para interposição de recurso, para propositura de ação e para a prática de outros atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório;

IX – os emolumentos devidos a notários ou registradores em decorrência da prática de registro, averbação ou qualquer outro ato notarial necessário à efetivação de decisão judicial ou à continuidade de processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido.

A Constituição Federal de 1988, consagrando o Estado Democrático de Direito, definiu em seu artigo 5º, inciso LXXIV, que o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. A previsão visa dar efetividade ao devido processo legal, consubstanciado, essencialmente – nas palavras do ministro Jorge Mussi –, na garantia à ampla defesa e ao contraditório.

“Não se pode conceber o exercício da pretensão punitiva por parte do Estado sem que sejam observadas as garantias do acusado à ampla defesa e ao contraditório, as quais, frise-se, não se prestam somente para zelar pelo interesse deste, mas também para que seja preservada a imparcialidade do órgão julgador, ao conduzir um processo no qual as partes foram tratadas de forma parelha, sem nenhuma vantagem para qualquer delas” – afirmou o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento do HC 368.318.

A assistência jurídica gratuita, que assegura essas garantias aos necessitados, é prestada pela Defensoria Pública (DP) – e também por outros meios – e se complementa com a dispensa do pagamento de despesas judiciais. Embora as expressões às vezes se confundam no debate dos tribunais, há doutrinadores que fixam uma distinção clara entre assistência jurídica (orientação e defesa em juízo das pessoas pobres) e gratuidade de Justiça, ou Justiça gratuita (dispensa de despesas judiciais).

 

A jurisprudência do STJ é ampla sobre a justiça gratuita

 

De acordo com a Constituição de 1988, artigos 134 e 135, cabe à DP “a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados”. A Lei 1.060/1950 estabelece normas para a concessão da justiça gratuita.

O novo Código de Processo Civil (CPC/2015), nos artigos 98 a 102​, dispôs sobre a justiça gratuita, prevendo ser o benefício direito da pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários de advogados e peritos. Até das despesas com exame de DNA, por exemplo, o beneficiário da Justiça gratuita está livre.

A Secretaria de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) produziu três edições (148, 149 e 150) do boletim Jurisprudência em Teses, com um total de 40 teses jurídicas sobre gratuidade de Justiça. Confira, na sequência, alguns entendimentos do tribunal sobre a matéria.

 

Defensor d​​ativo aos beneficiários da justiça gratuita

 

Ao julgar o RMS 49.902, de relatoria do ministro Reynaldo Soares da Fonseca, a Quinta Turma do STJ firmou o entendimento de que a DP não detém a exclusividade da prestação de assistência jurídica gratuita àqueles que não têm meios financeiros para contratar advogado, assim como não existe o direito subjetivo do acusado de ser defendido pela DP.

Na ocasião, o relator destacou que, caso não haja órgão de assistência judiciária na comarca ou subseção judiciária, ou se a DP não estiver devidamente organizada na localidade, é admissível a designação de defensor dativo, sem que haja declaração automática de nulidade do processo.

Reynaldo Soares da Fonseca rememorou decisão no RHC 106.394, de relatoria da ministra Rosa Weber, em que a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a preferência de nomeação da DP para a representação do réu incapaz de custear seu próprio patrono, caso o órgão esteja devidamente estruturada no local.

Porém, segundo o ministro do STJ, “tal interpretação é passível de uma série de exceções e mitigações, e não impede a substituição pontual do defensor público por defensor dativo” – por exemplo, no caso de o defensor público não produzir uma defesa efetiva, situação em que a própria lei aconselha sua substituição.

A tese foi aplicada também no julgamento do RHC 105.943, em que o relator do processo, ministro Felix Fischer, salientou que, em caso de nomeação de defensor dativo, “a declaração de nulidade exige a comprovação de prejuízo, em consonância com o princípio pas de nullité sans grief (não há nulidade sem prejuízo)”.

 

Requisitos​ legais da gratuidade judiciária

 

“O custeio da causa pela DP não expressa a automática concessão dos benefícios da Justiça gratuita, devendo ser observadas as condições necessárias para a obtenção de seus efeitos previstos em lei.” Essa foi a tese aplicada pela Terceira Turma do STJ no julgamento do AgInt no AREsp 1.012.133, de relatoria do ministro Villas Bôas Cueva.

No caso analisado, o réu recorreu de decisão da presidência do STJ que negou seguimento a recurso interposto por ele, sob o fundamento de que não foram juntados aos autos a guia de custas e o comprovante de pagamento do preparo.

O recorrente alegou que, por se tratar de processo com exercício de curadoria especial pela DP, a exigência de pagamento de custas representaria obstáculo à representação processual, além de configurar cerceamento de defesa e ferir os princípios do contraditório e da ampla defesa.

 

A justiça gratuita não se presume

 

Em seu voto, o ministro Villas Bôas Cueva citou decisão sob relatoria do ministro Marco Aurélio Bellizze no AgRg no AREsp 772.756, em que a mesma Terceira Turma decidiu que o deferimento da Justiça gratuita não se presume, mesmo na hipótese de a DP atuar como curadora especial, em caso de revelia do réu devedor, citado fictamente.

Ele lembrou ainda orientação jurisprudencial que define que “as guias de recolhimento e os respectivos comprovantes de pagamento do preparo são essenciais para a regularidade recursal, devendo ser comprovado o correto recolhimento no ato de interposição do recurso, sob pena de deserção”.

Em julgamento semelhante, de relatoria do ministro Reynaldo Soares da Fonseca (AgRg no AREsp 729.768), a Quinta Turma estendeu o entendimento de que não se presume a gratuidade de Justiça às causas patrocinadas pelos núcleos de prática jurídica.

 

Intimação pessoal dos advogados integrantes dos núcleos de prática jurídica

 

Ainda em relação aos núcleos de prática jurídica, a jurisprudência do STJ entende que seus advogados, por se equipararem aos defensores públicos na prestação da assistência judiciária gratuita, serão intimados pessoalmente de todos os atos processuais. O entendimento foi aplicado pela Quinta Turma no julgamento do AgRg no AREsp 780.340, de relatoria do ministro Gurgel de Faria.

Na ocasião, o relator reconheceu o direito de intimação pessoal dos advogados integrantes dos núcleos de prática jurídica, porém destacou que, apesar do privilégio, tais defensores não estão dispensados de apresentar a procuração ou o ato de nomeação judicial, por ausência de previsão legal.

Da mesma forma, o colegiado decidiu no HC 387.135, de relatoria do ministro Ribeiro Dantas, anular decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), por entender que a ausência de intimação pessoal do defensor do núcleo de prática jurídica constitui prejuízo à parte.

Ribeiro Dantas destacou que “o reconhecimento de nulidades no curso do processo penal reclama uma efetiva demonstração do prejuízo à parte, sem a qual prevalecerá o princípio da instrumentalidade das formas, positivado pelo artigo 563 do Código de Processo Penal”.

No caso dos autos, o magistrado destacou que, com a não realização da intimação pessoalmente, ficou “manifesta a ilegalidade imposta ao paciente”.

 

A justiça gratuita depende de expresso pedido da parte

 

Segundo a jurisprudência do STJ, o benefício da assistência judiciária gratuita depende de expresso pedido da parte, sendo vedada sua concessão de ofício pelo juiz.

Ao julgar o AgRg no AREsp 694.351, de relatoria do ministro Herman Benjamin, a Segunda Turma negou seguimento ao recurso de um sindicato que sustentou o direito à gratuidade de Justiça no âmbito do STJ, em virtude de ter obtido dispensa do pagamento de custas e preparo na ação civil pública que deu origem ao agravo interposto no tribunal.

Em seu voto, o ministro relator destacou que, neste caso, a alegação da parte não merece prosperar, visto que, se não há pedido de concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita anterior à interposição do recurso especial, nem decisão expressa que defira tal vantagem, não compete ao magistrado conferi-la de ofício.

“A concessão do benefício está condicionada à existência de pedido expresso do interessado em tal sentido, de modo a declarar que não está em condições de pagar as custas processuais e os honorários advocatícios sem prejuízo da subsistência própria ou de sua família.”

 

O deferimento da gratuidade judiciária tem efeitos ex nunc

 

Outra importante definição sobre o tema é que o deferimento do pedido de gratuidade de Justiça tem efeitos ex nunc, ou seja, não alcançam encargos anteriores ao requerimento do benefício.

Esse foi o entendimento da Quinta Turma ao julgar o AgRg no REsp 839.168, de relatoria da ministra Laurita Vaz. Em seu voto, a relatora afirmou que o pedido de gratuidade de Justiça pode ser formulado em qualquer fase do processo, inclusive na execução da sentença, porém, os seus efeitos não poderão retroagir para alcançar atos processuais anteriormente convalidados.

Caso se esteja na fase de execução do julgado, a magistrada salientou que o requerimento “não poderá ter o propósito de impedir a execução dos honorários advocatícios que foram anteriormente fixados no processo de conhecimento, no qual a parte litigou sem o benefício da Justiça gratuita”.

 

A justiça gratuita na ação de alimentos

 

Recentemente, a Terceira Turma decidiu que a gratuidade em ação de alimentos não exige prova de insuficiência financeira do responsável legal, tendo em vista que o direito à gratuidade tem natureza personalíssima (artigo 99, parágrafo 6º, do Código de Processo Civil de 2015) e que é notória a incapacidade econômica dos menores.

Porém, o colegiado ressalvou que, em tais casos, há a possibilidade de posterior impugnação do benefício, nos termos do parágrafo 2º do artigo 99 do CPC, o qual garante ao réu a chance de demonstrar a eventual ausência dos pressupostos legais para a concessão da gratuidade – preservando, dessa forma, o direito constitucional ao contraditório.

“É evidente que, em se tratando de menores representados pelos seus pais, haverá sempre um forte vínculo entre a situação desses dois diferentes sujeitos de direitos e obrigações, sobretudo em razão da incapacidade civil e econômica do próprio menor, o que não significa dizer, todavia, que se deva automaticamente examinar o direito à gratuidade a que poderia fazer jus o menor à luz da situação financeira de seus pais”, afirmou a ministra Nancy Andrighi, relatora do processo.

Com esse entendimento, o colegiado reformou decisão que havia indeferido a gratuidade por falta de comprovação de impossibilidade financeira da representante dos menores – a qual exercia atividade remunerada na época do pedido.

Em seu voto, a relatora destacou ainda que o fato de a representante legal possuir atividade remunerada não impediria, por si só, a concessão do benefício, e que o atraso da pensão alimentícia pelo genitor, no caso analisado pela turma, contribuiu para a redução do padrão de vida da família, o que justificaria a declaração de insuficiência momentânea de recursos.

“Diante do evidente comprometimento da qualidade de vida dos menores em decorrência do sucessivo inadimplemento das obrigações alimentares pelo genitor, geradoras de cenário tão grave, urgente e de risco iminente, não é minimamente razoável o indeferimento do benefício da gratuidade da Justiça aos menores credores dos alimentos.”

 

Contadoria ju​​dicial para os beneficiários da gratuidade judiciária

 

Em recurso repetitivo, a Segunda Seção, ao julgar o REsp 1.274.466, de relatoria do ministro Paulo de Tarso Sanseverino, definiu que, para a liquidação por fase autônoma, o beneficiário da assistência judiciária gratuita tem direito à elaboração de cálculos pela contadoria judicial, independentemente de sua complexidade.

O caso foi cadastrado como Tema 672 na base de dados de repetitivos do STJ e consolidou o entendimento firmado pela Corte Especial nos EREsp 541.024 e 450.809. Para definir a tese, o colegiado analisou a possibilidade de atribuição do encargo ao réu, na hipótese em que o autor seja beneficiário da gratuidade da Justiça.

Sobre a questão, a ministra Nancy Andrighi, relatora do REsp 1.200.099, observou que o fato de o autor exequente estar amparado pelo benefício da assistência judiciária não autoriza a remessa automática dos autos ao contador judicial.

Porém, ela afirmou que, uma vez requerida pelo beneficiário da Justiça gratuita a elaboração dos cálculos do valor da condenação pela contadoria judicial, não cabe ao juiz negá-lo com fundamento na análise da suposta ausência de complexidade dos cálculos ou na atuação da DP.

Isso porque, no caso analisado pela Terceira Turma, o tribunal de origem manteve decisão de primeiro grau que indeferiu o benefício, sob o fundamento de que o artigo 475-B, parágrafo 3º, do CPC – o qual dispõe que os cálculos poderão ser feitos pelo contador judicial nos casos de assistência judiciária – é exceção e só deve ser aplicado quando a elaboração dos cálculos apresentar complexidade extraordinária.

Nancy Andrighi lembrou que, de fato, a evolução legislativa reduziu o campo de atuação do contador judicial, mas não excluiu sua participação nas hipóteses em que a memória apresentada pelo credor aparentemente exceder os limites da decisão exequenda ou nos casos de assistência judiciária.

“O artigo 475-B, parágrafo 3º, do CPC, ao permitir a utilização da contadoria, excepcionando a regra geral de que os cálculos do valor da execução são de responsabilidade do credor, não faz a exigência de que o cálculo deva ‘apresentar complexidade extraordinária’, ou que fique demonstrada a ‘incapacidade técnica ou financeira do hipossuficiente’.”

Para a magistrada, “especificamente no que tange às hipóteses de assistência judiciária, é importante consignar que a finalidade da norma é claramente a de facilitação da defesa daquele credor que não tem condições financeiras de contratar profissional para realização dos cálculos sem comprometimento do seu sustento ou de sua família”.

 

Prazo para ​​comprovação da hipossuficiência financeira

 

Outra importante tese foi firmada no ano passado pela Terceira Turma ao julgar um caso envolvendo pedido de gratuidade de Justiça que foi indeferido sem ter sido aberto prazo para a empresa solicitante comprovar a alegada hipossuficiência financeira.

Ao julgar o REsp 1.787.491, o colegiado entendeu que a assistência jurídica gratuita só poderá ser negada pelo magistrado se houver elementos nos autos que indiquem a falta de critérios legais para a concessão do benefício, e apenas depois de intimado o requerente para comprovar a alegada hipossuficiência, como previsto nos artigos 98 e 99 do CPC/2015.

A relatoria foi do ministro Villas Bôas Cueva, que destacou que, “antes do indeferimento, o juiz deve determinar que a parte comprove a alegada hipossuficiência. Indeferido o pedido de gratuidade de Justiça, observando-se o procedimento legal, o requerente deve ser intimado para realizar o preparo na forma simples. Mantendo-se inerte, o recurso não será conhecido em virtude da deserção”.

A justiça gratuita a Pessoa ju​​rídica

Para o STJ, faz jus ao benefício da Justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais – entendimento firmado na Súmula 481. Com base no enunciado, a Terceira Turma, ao julgar o REsp 1.648.861, decidiu que o benefício só pode ser concedido à massa falida se comprovada a hipossuficiência.

No processo analisado pelo colegiado, a massa falida de uma empresa de alimentos contestou decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que não lhe concedeu a gratuidade por entender que massa falida de empresa não se enquadra no perfil de hipossuficiente adotado pelo legislador. O tribunal consignou ainda a necessidade de comprovar a falta de recursos para o pagamento das custas e despesas processuais.

Ao STJ, a massa falida alegou que estava em processo de falência e que não poderia arcar com as despesas judiciais, por não ter liquidez financeira.

Em seu voto, a ministra relatora, Nancy Andrighi, manteve a decisão do TJSP, seguindo posicionamento da Primeira Seção no EREsp 855.020, de relatoria do ministro Benedito Gonçalves, que concluiu que “o benefício da gratuidade pode ser concedido às massas falidas apenas se comprovarem que dele necessitam, pois não se presume a sua hipossuficiência”.

 

Fonte: STJ com adaptações

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